Wednesday 22 June 2011

A prática profissional de professor de música: alguns mitos e questões éticas

A PRÁTICA PROFISSIONAL DE PROFESSOR DE MÚSICA
por Teresa Vila Verde
Enquadramento
Desde muito cedo que o ensino da música se encontra no centro da minha vida profissional. Iniciei esta prática durante o meu período de estudante, encarando-a como um complemento aos meus estudos performativos e como uma fácil solução para ser independente. Logo aqui levantam-se várias questões. Qual a relação entre a prática do ensino e a prática performativa na minha perspectiva? Como evoluíram as minhas concepções pedagógicas, éticas e científicas ao longo destes anos? Que motivações éticas e profissionais nos devem hoje guiar o ensino musical das gerações futuras? Mais, no momento de contenção orçamental que vivemos qual a justificação para a sociedade e o Estado financiarem o ensino musical? Qual o real benefício desta educação a longo prazo? Que bem e que competências este serviço educativo presta? Estas são algumas das questões que pretendo reflectir neste pequeno artigo sobre a prática profissional dos professores de música.
Reflexão sobre a prática profissional de professor de música: alguns mitos e questões éticas
Começo por recordar os meus tempos de adolescência, durante os anos 80, onde se comentava em tom indignado o facto de os professores de música ganharem tanto como os professores de inglês ou matemática. Isto porque a disciplina de Música, a par de Educação Física e Religião Moral, era naturalmente considerada como sendo uma disciplina inferior às outras - àquelas cujo carácter técnico e/ou científico lhes conferia um prestígio e status social elevado, pois eram indiscutivelmente “úteis” à sociedade. Por ser difícil reconhecer a utilidade da música pela comunidade estudantil, a disciplina de música não merecia nem o seu respeito, nem o seu esforço. Este facto da minha memória reflecte os graves preconceitos e mitos enraizados na opinião pública relativamente a esta ‘profissão’. Preconceitos que ainda hoje estão presentes na sociedade em geral graças a uma visão funcionalista das profissões, a políticas tecnocratas que visam obter resultados visíveis a curto-prazo e a uma sociedade ainda crente na superioridade do lado intelectual, cognitivo, científico e tecnológico, face ao lado mais emocional, corporal, intuitivo, esotérico e impalpável do ser humano. Mas esta situação é também construída, paradoxalmente, pelos nossos pares, sejam eles colegas, professores ou músicos. O ensino da música, seja no ensino vocacional seja no ensino genérico, pulula de preconceitos e estigmas que devem ser rapidamente consciencializados e desmascarados por todos, a fim de desencadearem mudanças profundas na nossa concepção e prática de professores de música.
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Considerações Finais
Penso não ser necessário “proteger a música dos alunos” (Regelski 2009, p. 8) porque a música é muito mais do que o repertório clássico europeu e que os moldes concertísticos/performativos padronizados durante o século XVIII e XIX no centro da Europa. Hoje felizmente podemos pensar em múltiplos contextos de acção performativa, em infinitos cruzamentos da música com outras áreas de saber e de criatividade, numa ampla esfera de acção a nível de experimentação tecnológica e em estabelecer inusitadas colaborações com profissionais de todas as áreas; enfim, hoje mais do que nunca podemos tornar a música numa expressão de nós próprios, da nossa idiossincrasia e da nossa visão crítica do mundo. Para isso acontecer é preciso perder o medo de sair do padrão, do costume, do lugar - comum, do ‘porque sim’, e arriscar. Penso que esta é igualmente uma função ética dos professores.

Teresa Vila Verde


Ps. Retirei parte substancial deste artigo para preservar os meus direitos de autora.


Bibliografia
Hargreaves, D. (1999). Desenvolvimento musical e educação no mundo social. Acedido em Setembro 2009 em: http://cipem.files.wordpress.com/2007/03/artigo-1.pdf
Milhano, S. (2009). Música na escola do 1º ciclo do ensino básico: dos benefícios e enriquecimento educativos generalizados ao apuramento de vocações. Actas do XVII Colóquio AFIRSE. A escola e o mundo do trabalho, Lisboa: FPCE.
Regelski, T. A. (2002). On ‘methodolatry’ and music teaching as critical and reflective praxis. Philosophy of Music Education Review, 10(2), 102-23.
Regelski, T. A. (2009). The ethics of music teaching as profession and praxis. Visions of Research in Music Education, 13. Retrieved from http://www-usr.rider.edu/~vrme/
Small, C. (1998). Musiking: the meanings of performing and listening. Hanover NH: Wesleyan University Press.
Uscher, N. J. (1998). Shaping inventive career for 21st century musicians: embracing new values and visions. In H. Lundstrom (Ed.). Perspectives in Music and Music Education (nº 3, pp. 13-17). Malmo Academy of Music Publications.

1 comment:

  1. Um trabalho realizado no âmbito da disciplina de "Seminário de Práticas de Música" da Universidade Aberta (Março 2011). E, sim, tive 100%!

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