Thursday 25 September 2008

(Última) Crónica inglesa 13: 'Round Midnight


Na passada segunda-feira (22/09) apresentei o meu projecto final de Mestrado onde andei à volta de um tema de jazz ('Round Midnight de Thelonious Monk): improvisei, cantei, dancei e, claro, toquei piano. Como sempre, esqueço-me daquilo que faço, ficando apenas na memória alguns detalhes e sensações que vivi no momento. Eu preciso dos outros para reavivar a minha percepção. Fiquei espantada com o feedback do outro lado, em especial com as palavras da Sarah Nicolls, a minha supervisora. Aquilo que eu pensei ter sido o meu pior momento, por ter sido o menos preparado, estruturado, onde senti medo por não saber o que fazer a seguir, enfim..., afinal foi o melhor. Credo! O júri encontrou aí autenticidade, fragilidade, vulnerabilidade e humanismo. Avaliaram tudo por prisma bem diferente do meu. Fiquei atónita!!! Isto está a fazer-me parar para reequacionar tudo…

Eu ando a pensar TUDO ao contrário e isto deve-se a muitos factores.
Primeiro, ao facto de ser europeia, de pertencer a um país católico, com uma longa história, que me prende inevitavelmente a certas convenções, preconceitos e medos.
Segundo, à minha educação pré-universitária numa aldeia do Norte, onde um forte catolicismo me moldou de forma indelével em muitos aspectos (nem todos maus!), onde "boa educação" significava ter um controlo total sobre nós próprios e onde mostrar os nossos verdadeiros sentimentos aos Outros, pelo menos de forma visível e frontal, era considerado como fraqueza.
E terceiro, o facto de viver num mundo que hipervaloriza o lógico, o estruturado, o premeditado, o asséptico, em detrimento de outras dimensões humanas.
Afinal, foi exactamente por não ter sido assim tão controlada e premeditada que me valorizaram (Thank God!). Aquilo que eu pensei ser a minha maior fraqueza foi afinal o meu maior trunfo: a vulnerabilidade.
Continuo espantada! E contente porque vejo que afinal os meus instintos estavam certos. A minha parte racional é que me impediu ir mais longe e de atingir o transe que consegui nalguns ensaios – o transe que vi no rosto da Marina Abramovich.
Marina Abramovich nasceu no ex-país da Jugoslávia, é "performer artist" e é a minha descoberta mais recente. Fiquei impressionada com uma foto sua onde os seus olhos estão imersos em lágrimas enquanto o seu corpo é passivamente usado por outras pessoas: tiram-lhe as roupas, escrevem palavras na sua pele, põe uma pistola carregada na sua mão apontada para a sua cabeça (isto aconteceu nos loucos anos 70!).
Bem, o que mais me impressionou foi ver o histerismo das pessoas a fazer isto e o facto de elas não verem no rosto de Marina uma dor resignada. Não sei explicar… Esta entrega passiva à mercê da agressividade dos outros, a sua vulnerabilidade, o seu estado semi-inconsciente, tudo isto me impressionou. É exactamente essa entrega, essa vulnerabilidade e essa humanidade que quero.
Porque nós não somos cartesianos mas freudianos. TODOS nós somos seres complexos. E, em vez de me aterrar esta ideia, ela interessa-me profundamente. É por isto que os seres humanos me fascinam e me comovem todos os dias. Os seus traumas do passado, que se revelam por pequenos gestos, muitas vezes por uma agressividade verbal, por um pessimismo constante, por um olhar frio e por um corpo passivo, devorado ou devorador. A tudo isto estou atenta.
Pina Bausch resume tudo isto com esta frase: "I don't care how people move but what moves them". Eu também penso assim .

Voltando ao meu projecto final, esta performance tornou-me ainda mais confiante no meu trabalho. Verifiquei que posso e devo ir mais longe na minha entrega emocional. A Sarah encorajou-me muito a prosseguir estas performances: performances com música, mas improvisada. É um grande desafio para mim. Continuo a afastar-me cada vez mais do perfil normal de músico e a entrar mais na "live art", que me atrai pelos seus "não-limites".
Aqui posso explorar tudo e fazer "personal statements", o que é uma grande responsabilidade.
Não sei…preciso de tempo. E como compatibilizar isso com contas para pagar? Eis uma grande questão.
Só vejo uma solução: ter um "brain-less job". Algo que não implique muito esforço criativo da minha parte afim de poder canalizá-lo para outra esfera. Enfim, grandes questões me esperam neste regresso a Portugal. Período de reorganização interna e externa.

E regresso ao Porto. Ao conforto da minha casa. Hoje decidi ser turista na minha cidade. Pus sandálias, auscultadores, mochila e caminhei pelas suas ruas. Guardo a imagem de um casal de idosos a chegar de táxi ao Hospital S. António. Comoveu-me. Ela toda vestida de negro e o Sr. tinha uma fragilidade tão digna que me comoveu. Ele, cujo rosto vi com mais clareza, era lindo! Não no sentido monocromático que vejo nas revistas, mas lindo na sua humanidade, numa vida cheia espraiada no seu rosto cheio de ruguinhas, no seu fato domingueiro, muito limpo, de corte e vinca impecável. Ele sentiu o meu olhar; sorri e continuei o meu caminho.
Senti-me reconfortada com esta Portugalidade. Apesar de trabalhar e viver no contemporâneo não me choca nada o passado ou as nossas tradições. Elas dão um sentido de pertença que preciso. São as raízes que permitem gerar folhas e frutos.
E depois choro quando vejo as águas do Douro. Choro por tudo...
É um regresso que me soa a choque e a beleza. Esta luz outonal, este calor ameno, este verde do Palácio, este pulsar calmo tira-me de qualquer racionalidade. Fico parada. E vêm-me as grandes questões: Como estou? E agora? O que vai ser de mim? Por onde prosseguir? Como estás, Teresa?

Teresa

Thursday 7 August 2008

Crónica inglesa 12: Festival Dínamo

Que dizer? Sinto falta de uma ligação a algo mais...por isso escrevo.

O melhor dos dias são as noites... já não sabia o que era estar sentada num jardim nas primeiras horas da madrugada, com o corpo cansado e com uma satisfação interior de dever cumprido. Fico horas assim, sentada neste banco de jardim. A sentir a temperatura amena na pele, a ouvir o silêncio, e a "ouvir-me". Pergunto-me: como estás Teresa?

Estou parada, calma e nostálgica. Porque se aproxima a hora de me despedir deste banco, deste riacho, destas árvores e desta relva verde, sempre verde. Porque aprendi muito e fiz o que gosto ao longo deste ano. Sim, tive lágrimas, mas o saldo é francamente positivo.

Penso em Portugal, onde pessoas pagam do seu bolso para organizarem festivais fora do espírito massificador/consumista e lutam por um respeito elementar à diferença. Estes têm de ser os nossos heróis! Por isso transcrevo a minha resposta ao organizador do festival Dínamo (festival de músicas exploratórias) que decorreu na terra sacrossanta de Barcelos!! Eu não consigo imaginar algo de alternativo/experimental a contecer na minha terra-berço, sempre tão avessa a ambições de qualquer ordem. Às vezes aparecem oásis como este...

«Olá Luis Jacinto, obrigada pelas informações. Acabo de ver o site "esquilo" e é bom ver que há muita coisa para eu ouvir, conhecer e aprender. Fiquei curiosa. E surpreendida. Sim, Portugal é um país periférico, mas não me parece à deriva do resto do Mundo. Há sempre oásis a aparecer e lutas a acontecer. Há muita "cena" alternativa e isso enriquece-o.

Este ano estive praticamente isolada do mundo, num local incrivelmente internacional mas, infelizmente, muito igual. Pergunto-me, como é possível que as pessoas, que vêm de todos os hemisférios e latitudes, sejam tão idênticas, tão pouco curiosas pelo mundo, tão pouco ousadas na Vida? Como é possível se contentarem com tão pouco e ainda por cima sem serem capazes de pensar se isso é o que realmente querem? Por isso, felicito-vos pela organização de algo alternativo, arrojado; algo que questiona o que entendemos ser "música". A arte não pode ser direitinha, conformada, demasiado confortável. Às vezes ela tem de ser, como diria Antonin Artaud, "cruel". Eu uso a música para as questionar sobre tudo isto, como provocação. Mas sempre de forma "amável", sem gritos histéricos. Sempre com muita calma. Por isso faço "performances".

Estar nesta universidade foi-me muito enriquecedor. Aprendi o que é improvisação, que eu transformo em performance, e encontrei os livros que justificam tudo o que faço. Portugal deu-me coisas boas, claro, mas faltaram estas duas coisas: livros e improvisação. Por isso, há que continuar, espero que com apoios da próxima vez, porque um mundo sem alternativas é um mundo cruel! Parabéns pelo vosso esforço e vou ficar atenta às vossas actividades.»

Teresa

Wednesday 2 July 2008

Crónica inglesa 11: Everything must change!

Que é feito de vós? Que é feito de mim?

Ontem fui ao encontro de lusos que estudam ou investigam aqui no Reino Unido (LUSO2008 em Oxford). Oradores muito bons. Alguns conhecidos, outros nem tanto, mas todos muito bons. Falaram das suas razões, dificuldades, alegrias em regressar (ou não) para Portugal, após a sua experiência inglesa.

Que aprendi?
Que a vida se faz aos ziguezagues, de decisões com período de validade, de flexibilidade e de espírito empreendedor. Nós Portugueses somos uns eternos "sebastiânicos"; estamos sempre á espera de quem nos descubra, nos resgate, nos salve, nos dê as respostas certas. Em alternativa, porque não sermos pró-activos e criarmos o nosso próprio espaço de expressão no mundo? Como sempre, tudo está dentro de nós.

Aquele mundo de certezas feitas, de planos perfeitamente delineados (ao pormenor!) quanto ao nosso futuro, isso tudo já era. Vivemos num mundo em constante mudança, volátil, virtual, em que tudo nos seduz e nos promete facilidades e sonhos (obviamente, sem envolver qualquer esforço da nossa parte!). Face a tudo isto temos de ter a coragem, se for necessário, de mudar, de alterar, de ajustar, de flexibilizar os nossos planos e convicções. É aqui que reside o segredo de viver no mundo de hoje. Neste mundo que eu tento perceber quer vivendo-o ‘por dentro’ quer observando-o 'de fora'. Pergunto-me: Quem somos? Como vivemos? O que nos move? Como nos exprimimos? Não acho que seja um mundo melhor ou pior que o do passado. É um mundo diferente. Um mundo que exige pensamento crítico. E depois, novas formas de estar e de nos exprimirmos nele.

Ontem também (re)aprendi que os campeões não são aqueles que não erram ou que nunca perdem. São os que se levantam a seguir; os que face às dificuldades persistem e procuram respostas alternativas noutros caminhos. Foi o que João Rocha (um ilustre ‘desconhecido’ da Universidade de Aveiro) me lembrou com a sua apresentação. Exemplo de sobriedade, de espírito de luta face às adversidades e de alguém que se fez fora dos caminhos normais de ‘sucesso’. E eu também me sinto um bocado fora: fora na minha forma de fazer música; fora do espírito normal dos conservatórios; fora das universidades míticas da música; e sei lá que mais.

A sua comunicação fez-me recordar os meus dois últimos exames desta temporada. Na passada segunda-feira fiz o pior exame da minha vida. Era um projecto de música improvisada em que outros músicos tocavam o que eu planeei. Eles não perceberam o que eu queria e o resultado não foi nada bom. Enfim, fiquei de rastos. Apesar do meu cansaço extremo, tinha de arranjar forças para reverter a péssima impressão que fiz e fazer algo muito bom no dia seguinte, no meu projecto a solo. E fiz!

Era suposto e esperado que tocasse piano. Isto é, que modelasse os meus gestos para obter certo resultado sonoro. Mas, perguntei-me, não há tanta gente a fazer isso tão bem? Que posso trazer de novo? Resolvi fazer o oposto. Em vez de partir do som, parti do meu corpo. Trabalhei movimentos, gestos e acções que produzissem um som por consequência deles. Som como um fruto secundário (mas não residual!) dessa "coreografia". Criei uma história, uma narrativa, um plano de eventos, uma metáfora da vida através das minhas mãos e o resultado de tudo isto, quer em termos visuais quer sonoros, foi no mínimo...forte! Não queiram saber da minha enorme satisfação. A satisfação de ter consegui ultrapassar a minha "derrota" e apresentar-me ao mais alto nível criativo. E é aqui que tudo faz a diferença; no dar a volta ás dificuldades, em não desistirmos de fazermos melhor.

Sou um ser humano. Tenho fragilidades e limitações. Mas também tenho uma força que me faz exceder tudo isto! A Arte é isto mesmo: uma transcendência e uma ilusão. Por momentos consigo exceder todas as minhas limitações. Naqueles minutos que estou no limbo, vivo no nirvana, num mundo de utopias, regresso à felicidade da infância. Sou muito muito FELIZ!! Quando termino a performance, volto a ser normal. E sou feliz por ser normal. É nesta dualidade que encontrei o meu equilíbrio.


Teresa

Monday 23 June 2008

Formas 2008 - Feira de Artes Performativas, Tavira

Eis o abstract que escrevi para apresentar na plataforma "pitching" do Formas 2008, realizado em Tavira nos dias 1 - 3 de Julho.

«Theatricality and Improvisation in Musical Performance
Musical performance is typically understood and studied as a mere sonic event. However, a live performance naturally adds a visual dimension that cannot be neglected by musicians. My conviction is that this dimension is even more crucial in the reception of new-made music - an aspect that I expect to study with more depth in the future. Now, to overcome the traditional visual impoverishment of the musical concert I started exploring the theatricality in my musical performances. Here, “theatricality” is used in the sense described by the French theatre producer Antonin Artaud (1896-1948): it means to make use of the whole body (and not just of the hands) to play an instrument and to employ adequate stage techniques like lighting, scenery or media to enhance the theatrical (musical) message. As a result, I mixture written musical pieces with musical (and non musical) improvisation, body/gesture movements, acting, vocal effects, technological devices, and so forth. So, as the title suggests, it is at the interface between musicianship and performance artistry that I intend to focus my future artistic and academic paths. To do this I chose the contemporary repertoire because it can more easily accommodate new perspectives around music-making and allow performers to stamp their personal ideas in a more creative manner. Additionally, new music is more acquiescent to be cross-fertilised with other elements, taken from other performing arts and technologies, and this represents an exciting field for those interested in experimenting with new paths for artistic and personal expression.»

Saturday 9 February 2008

Crónica inglesa 10: Dias de Catarse

Sol.

Têm amanhecido uns dias solarengos por estas terras. É estranho ver este sol forte pela janela; não o associo a Londres mas ao Sul de Portugal. Lembra-me Lisboa, capital tão branca e luminosa. A nossa capital tem algo de único. É atlântica. É oceânica. Tem um horizonte infinito que logo mesuscita saudades. Que bons momentos passei por Lisboa.

Nas últimas semanas passei uns tempos turbulentos. Por isso preferi não escrever. Estive muito, muito sensível, até mesmo deprimida. Vivi uma tensão constante e nem sempre tive forças para eliminar os pensamentos mais obscurosda minha mente. Mas tudo isso já passou. Estes dias têm sido ‘catárticos’.

Fiz a minha «performance com música» e correu MUITO bem!! Quão natural foi para mim tocar e improvisar daquela maneira. Sofri semanas à espera deste momento, mas quando ele chegou, só me restou fazer uma coisa: brincar,divertir-me! Fiz a minha catarse em palco e sempre com muita, muita calma. É sempre bom sentir os olhares das pessoas atentas aos meus gestos/movimentosmais ínfimos; até mesmo á minha respiração. O público é a minha maior inspiração. A minha tutora ficou rendida Finalmente ela compreendeu a minha linguagem; a minha forma de fazer música. Sinto-me compreendida e acarinhada. Cheia de vontade de voar, voar, voar...

Graças também a ela também resolvi o meu único problema 'relacional' aqui naBrunel e que se prendia com um Professor meu. Cansei-me do seu espírito crítico e queixei-me à minha tutora; graças a ela fui recebida com sorrisos e com um olhar directo por ele. Apesar do meu espanto, que quase me petrificou, consegui reagir e pedir-lhe uma conversa.Falei. Falamos. Unicamente de aspectos profissionais, mas foi o suficientepara resolvermos os nossos mal-entendidos; agora estou muito mais aliviada e confiante. As reconciliações são poderosas. Elas mudam repentinamente a percepção que temos das pessoas: de pessoa horrível ele passou a ser pessoa sensível. Apenas se assustou comigo e interpretou o facto de eu nem sempre concordar consigo como algo ofensivo à sua pessoa, como arrogância e falta derespeito pelo seu trabalho. E não é nada disso. Eu só procuro a minha linguagem por caminhos diferentes. Bem, agora só quero estar bem com ele e sentir a sua confiança em mim. Portanto, vivam as reconciliações! Elas têm de acontecer mais vezes na Vida. Acho que é uma sorte quando podemos resolver assim os nossos equívocos com os outros. Esta foi a minha segunda catarse da semana.

E para terminar, uma terceira catarse, agora a nível pessoal. Aproveitei a onda e decidi cortar de vez com o meu Passado mais recente. Quero partir para o Presente sem amarras. Sinto-me outra vez livre para viver. Em suma, precisei de chorar um bocado para me renovar. Para renascer o so ldentro de mim, tal como acontece lá fora.

Sol.

Teresa

PS. Música do Philip Glass.

Saturday 19 January 2008

Crónica inglesa 9: Pina Bausch


Consegui!!! Consegui comprar um bilhete para ver finalmente ao vivo a companhia da Pina Bausch, a Wuppertal Tanztheatre, em duas criações emblemáticas: «A Sagração da Primavera» e o «Café Muller». Após tantos anos de espera...

O trabalho da Pina Bausch é uma inspiração para mim.

Porque o que conta são as pessoas. Somos nós. As suas histórias são as nossas histórias. Vemos abraços, encontros, desencontros, alienação e a procura desesperada de um sentido no meio do caos. Pina fez-me tomar consciência de que toda a criação artística é uma metáfora da Vida, onde o passado se cruza com o presente. E talvez com o futuro...

Porque a sua matéria-prima são as emoções. São as nossas emoções. No ‘Café Muller’ há uma distância brutal entre todas as personagens; elas nunca se encontram… é-me muito perturbador. Duas delas estão absorvidas num abraço inerte. São ausentes, anestesiadas, talvez oníricas; há a mulher solitária. Nervosa, perdida em gestos indecisos. Ela procura e procura, mas não sabe o quê, onde nem porquê; e depois o 'waiter', a personagem mais real no meio de personagens isoladas no seu mundo. O rapaz que procura em vão compor o mundo através das cadeiras e dos abraços. Eu pergunto, no meio destas personagens onde estamos nós? Somos aqueles dois seres que se abraçam como que fugindo ao que os rodeia? Ou aquela mulher perturbada, perdida em si própria? Ou aquele ser que procura desesperadamente pôr ordem nas cadeiras do café? Não fomos todos já um pouco destas personagens? Sim, a distância entre elas é tremendamente perturbadora. E é nesta distância ou tensão que eu quero trabalhar.

Porque os seus bailarinos estão longe dos padrões de beleza e de performance física que nos são apresentados a todo o momento pela TV e media em geral. Os seus bailarinos são pessoas como nós. Os seus corpos também envelhecem, ganham rugas e marcas com o tempo. Pina B. sabe que um corpo sem marcas é um corpo sem histórias; é um corpo incapaz de uma expressão inteira. Por isso ela não trabalha com belezas plásticas e rígidas; ela trabalha com pessoas como nós. Com corpos que sentem como os nossos. E o sentir forte não é apanágio da juventude. É apanágio do ser humano;

Pina B. é uma pessoa que se atrapalha com as palavras. Não é através delas que melhor se exprime. É pelos gestos das suas mãos. É aí que tudo começa. Tudo o que nos é apresentado um dia como grande e sofisticado, começou por uma pequena pergunta ou por um movimento não pensado. Mais uma vez, a importância das coisas sem importância...

Por tudo isto e muito mais, ela me inspira.

Teresa