Saturday 27 October 2007

Crónica inglesa 6: Nada para vos contar...

Uma boa consequência dos meus últimos mails foi o facto de receber mensagens e mensagens, até dos mais 'adormecidos'. Algumas com observações críticas; outras profundamente agradecidas, por sentirem empatia e conforto com as minhas palavras; e a mais extraordinária foi saber que pus alguém a chorar. Mas que privilégio, meu Deus!! As palavras têm mesmo poder...

Reparei à dias que o meu diario está 'vazio' de escritas. Não tenho escrito nada. Apercebi-me então que vocês são o meu 'diário'. Pela primeira vez, partilho o meu 'livro' com alguém, que são vocês! (Confesso que me arrepia um bocado esta ideia...)

Não tenho nada de excitante para vos contar. A semana foi uma trapalhada:

  • Ontem fui acordada com o alarme de incêndio Não sei como não andei mal-disposta todo o dia. Claro que fui a última a sair do edifício. Não me apetecia ir de pijama para a rua e 'desconfiava' que era um ensaio. O costume, em hora de pânico eu sou clamíiiiiiissima!! Mais tarde recebo um aviso horrível, quase a tratar-me como criminosa, por não ter saído do quarto em menos de 1 minuto. Enfim...
  • Não tive performances esta semana, ou seja, não tive 'pedradas', que chatice!! Mas fui boa menina e estudei piano. Pedro já toco a tua 3ª peça e é tão bonita!!! Está cheia de tensão, de energia, de movimento; depois fica envolta em mistério e transe, terminando de uma forma 'apaziguadora'. Tanto, só em apenas duas páginas de música! Vou ter de ser ´várias pessoas' em pouco tempo. Isso é-me estimulante, claro;
  • Hoje não fiz o monóloguo previsto para 'acting' porque a linguagem era extraordinariamente difícil e incompreensível no sentido, mesmo para um inglês. Agora tenho outro, mais fácil, sobre uma rapariga que tem dúvidas se deve aceitar a proposta de casamento do seu noivo (casar ou não casar? Eis a questão). Enfim, vou 'viver' um enredo de telenovela mexicana;
  • Estou chateada porque não fui ao ensaio da música improvisada. Sim, estou cansada, mas talvez 'ressuscitasse'... que seca!
  • Amanhã tenho sessão sobre mais um tema novo para mim e não tive tempo para ler tudo. Nem o facto de ser sobre o 'Género e Sexualidade na Música' me fez ser 'responsável' nas leituras...
  • Estou mal do estômago e só penso no chã de hipericão do Gerês. Como é possível ainda não ter descoberto uma lojinha de chãs decente por aqui? Como alternativa, vou tomar chã de 'água quente' (ainda se a água fosse boa...);
  • A única coisa 'excitante' que me aconteceu é que fui a escolhida para apresentar um trabalho de grupo num seminario sobre 'effective reading'. Numa situação normal eu recusaria e morreria de pânico. Aqui eu pensei: olha, porque não?? Mais uma vez, custou-me dizer a primeira frase mas depois nem o inglês atrapalhava. Não fui a nona maravilha do mundo, mas também não fui nenhuma nódoa. Os colegas gostaram e isso basta-me. O melhor foi, sem dúvida, sentir uma confiança espontânea de pessoas que não conheço de lado nenhum em mim. É-me reconfortante. Mais uma vez, não tenho medo de me experimentar em novas situações. Aprendo tanto sobre mim...


Como vêm, não tenho nada para contar. Para a próxima talvez seja mais poética (ou polémica?). Beijinhos!

Teresa

Saturday 20 October 2007

Crónica inglesa 5: Resposta à crónica anterior



Vejo que o meu discurso ás vezes perturba as pessoas. Não se esqueçam que foi o facto de não me sentir satisfeita com a minha Vida que me fez procurar outro rumo. Procurei, pedi ajuda, trabalhei, tive respostas boas e outras menos boas, persisti e por fim...acabei aqui. Eu mereço tudo o que tenho aqui. Eu trabalhei para isto. Claro que tive ajuda de pessoas que foram generosas comigo. Sem elas tudo seria bem mais difícil. Agradeço-lhes.

O meu entusiasmo vem essencialmente dos projectos/workshops que faço fora do Mestrado. Sinto-me apreciada e valorizada pelos professores e pelos colegas com quem tenho colaborado num 'Documentário'. Deram-me oportunidades e eu revelei-me tal e qual sou. Sem a arrogância de quem sabe muito (eu tenho dúvidas; eu não sei tudo), mas também sem medo de mostrar o que sei. Fui verdadeira comigo própria e gostaram de mim. Agora tenho uma 'identidade' e as pessoas sabem o meu nome. Por isso, digo-o mais uma vez, eu mereço-o tudo o que tenho aqui.

O que me espantou no ensaio dos New Noise, e que originou a minha reflexão, foi a recepção que tive. Não me conhecendo de lado nenhum o líder do grupo perguntou-me simplesmente isto: «Que instrumento tocas? Piano? Tens aí um piano, toca connosco». Em Portugal é mais usual perguntarem-me: «Quem és tu? Com quem estudaste? Qual a tua média de curso?» Há algo bem diferente nestas duas abordagens. Eu procuro a resposta. PORQUÊ? Acho que ainda não tenho a resposta para isto (falei no medo de errar, com uma possível razão) mas asseguro-vos que vou procurá-la.

Outra diferença é que neste grupo os mais experientes tocam conjuntamente com os mais inexperientes. Ninguém pergunta às pessoas se são 'undergraduate' ou 'postgraduate'. Perguntam se querem improvisar/fazer música e só depois pelo seu nome. Gosto deste clima informal, onde várias personalidades, experiências e culturas se misturam, onde todos fazem música por puro prazer, sem distinções de nenhuma espécie. Há uma abordagem inclusiva da música que sempre senti falta em Portugal, onde a música é algo elitista ou clubista. Sempre as distinções, sempre a procura dos mitos, das vedetas da nossa rua...


E sim, eu sei que estou fora da vida real. Eu não vejo TV, eu não tenho jornais portugueses aqui, raramente alguém me conta o que se passa por Portugal. O meu mundo é feito de livros, de criações, de experimentação, de análise, de ideias, de conversas interculturais, etc. É irreal, eu sei. Mas a razão de tudo isto é poder voltar um dia para o meu querido país e ser capaz de contribuir de uma forma mais consciente para uma mudança. Uma mudança na forma de se pensar, de se fazer e de se ensinar Música, que quero mais inclusiva e humana. É em Portugal que eu quero agir. Não estou aqui só para mim.

E estou a aprender empiricamente, ou seja, fazendo. Por enquanto estou livre de 'essays' por isso posso a explorar mais o lado performativo. Mas virá o tempo em que terei de passar a vida junto ao computador. Mas também aí estarei a produzir algo criativo. Cada momento tem o seu 'prazer' e a sua dificuldade. É assim que vivo. Sendo inteira em cada momento (Fernando Pessoa diz algo assim).

Eu decidi viver o presente. Eu estou a arriscar e não tenho garantias de nada quanto ao futuro. Só posso garantir uma coisa: que não serei a mesma pessoa que era antes de vir para aqui e se tiver de fazer as mesmas tarefas que sempre fiz, não as farei da mesma forma. Esta é a minha única certeza. Quanto ao resto... não estou preocupada. E sabem porquê? Simplesmente porque ainda não chegou o momento! Agora, não é esse momento. Agora é tempo de absorver o máximo; de aprender a todos os níveis. Por isso, Carpe Diem!

Teresa

Crónica inglesa 4: Pensamentos sobre nós, Portugueses



Afinal aquilo que pensava ser a excepção está a tornar-se a regra!! Em vez de vos descrever o que fiz vou apenas transcrever algo que pensei e escrevinhei no ensaio do grupo de improvisação 'New Noise' que assisti há poucas horas:

«Esta música poderia durar horas e horas... não me cansa. Só me apetece saltar desta cadeira e dançar ali mesmo, no meio. Porque me sinto tão capaz de fazer isto? Porque sou repentinamente tão extrovertida? Porque me sinto tão capaz de me exprimir livremente aqui?

A resposta é simples: aqui não tenho medo de errar! Em Portugal senti sempre um medo de errar; um medo de não ser boa o suficiente; um medo disto, um medo daquilo...isto é um peso terrível para quem é jovem e precisa de aprender. Só conseguimos crescer experimentando e, provavelmente, errando. Depois vem a vontade de superar o erro. E isto é que é aprender. Porque não experimentar algo novo? Só porque sim, 'just for fun'? Acho que nós, Portugueses, precisámos de ter a coragem de errar. Iríamos mais longe ainda...

Já que falei em Portugal aqui vai: acho que Portugal tem, sem qualquer dúvida, gente muito competente e consistente no seu 'métier'; há mesmo muito potencial humano. Mas falta algo, algo que impede as pessoas de ir mais longe. Penso que o nosso maior problema é a inveja 'do vizinho', é pensar no que está ao nosso lado como referência em vez de olhar mais longe e mais alto. Faz algum sentido isto? Para mim, faz.


O que sei é que aqui tenho muito ar para respirar; tenho muito espaço para me movimentar; tenho o tudo o necessário para me descobrir. Aqui brotam-me ideias e ideias para trabalhar; faço coisas incríveis que nunca tive a coragem de fazer e descubro que afinal sempre as tive dentro de mim. Tudo brota com uma facilidade e uma intensidade que me espanta! Aqui tudo me é fácil...que se passa? O que esteve mal até agora?

Em cada dia que passa os meus horizontes alargam-se mais e mais, e o meu entendimento do que é Música é MUITO mais do que aquilo que aprendi no passado. Quanto à parte performativa (meu Deus!) há algo que está a explodir em mim. Sinto-me finalment una, livre, naturalmente expressiva em tudo o que faço ou toco. Acho que estou a viver um sonho!

Voltando á música, o que ouço agora poderia ser um belo exemplo do pós-modernismo na música. Tudo aos pedaços; ouço um bocado de todos os estilos e ambientes sonoros possíveis. Ouço o TUDO, a síntese, a mistura. E não é caótico. Soa-me mesmo bem. Hoje já não há o mito da originalidade. Já tudo foi inventado. Resta-nos, como disse Baudrilllard, brincar com os pedaços. É o que faz o 'New Noise'»

Um bocadinho da minha inspiração para vocês!

Teresa

Friday 5 October 2007

Crónica inglesa 3: Um dia bom!


Ontem tive um dia bom.

Dia bom porque eu e as minhas mãos vão ser o tema de um documentário. Vão filmar as minhas mãos primeiro num contexto doméstico, fazendo gestos comuns aos de toda a gente, e depois num contexto musical, estudando ou tocando piano. Gostei da ideia e, além disso, tal poderá ser o início de projectos de outra dimensão: Senti muita empatia com a realizadora. Como ela está cá a especializar-se em documentários, vai passar a perseguir-me na vida.

Dia bom, porque já tenho ideias para a minha primeira 'performance/lecture'. Vou desenvolver as minhas ideas do costume: o gesto musical, a teatralidade e a sua função comunicativa com o público. É mesmo bom já ter interesses prévios. Eu não ando aqui à procura de um objectivo de trabalho. Eu já o tenho. Agora resta-me comunicá-lo e testá-lo junto dos Outros.

Na consequência disto, tive dia bom porque recebi uma mensagem de uma universidade do País de Gales (Aberystwyth University) ) a querer saber mais sobre o meu projecto de trabalho. Eles têm lá um Master em 'Audience and Reception Studies' que me pareceu muito na minha onda, por isso contactei-os. Foram receptivos às minhas ideas, por isso devo visitá-los em Dezembro próximo. Tenho de me preparar bem antes de ir, em especial na área das metodologias sociológicas que vou usar, algo que eles estão especialmente interessados em conhecer.


Dia bom porque fui experimentar um grupo vocal para 'vozes treinadas' e adaptei-me bem ao repertório (género 'musical'). Os colegas são essencialmente actores, ou seja, fazem tudo para chamar a atenção (que me perdoem todos os outros actores, os que não têm tiques de estrela). Claro que não foram muito simpáticos para mim, mas eu estou-me nas tintas. Fiz o que tinha a fazer: abri a boca, cantei e consegui chamar a atenção de quem realmente interessa, ou seja, da Professora. No final ela veio ter comigo pedindo para ficar no grupo e disse-me que tinha uma voz boa para fazer solos. Senti-me reconhecida e isso pôs-me mesmo bem.

Dia bom porque tive uma aula de 'acting' e correu bem (aqui posso ter aulas de tudo: acting, music, painting, singing, jazz, potering, etc. E todas de borla!). Foi um dia calmo, só com exercícios respiratórios e de voz, mas vi que posso aprender muito neste clima informal. A professora é fantástica. E talvez retome as minhas aulas de canto, se ela tiver um espacinho de tempo...



Boa semana para todos!

Teresa